domingo, 19 de fevereiro de 2012

Relicário da Saudade (Felipe Ramos e Ana Iara)

    Neste inicio de noite, num domingo úmido e monótono, procuro minha paz de espirito pelos cantos do meu quarto, nos antigos versos empoeirados pelo tempo, até mesmo em minhas mais obscuras lembranças, mas infelizmente, nada. O fato é que minha vida, até pouco tempo, estava sendo apenas uma sucessão de felicidades e surpresas boas,contudo, percebo o quanto uma fração de minutos pode mudar até a consistência da alma. Me intrigo, me questiono e, sem forças ou até vontade de relutar, decido me entregar a voz da tristeza que me perturba tanto os ouvidos, na mesma frequência na qual preciso respirar.      

    Agora entregue a angustiante solidão, percebo que ela partiu-me em dois, pois enquanto a alma se alimenta de sua inspiração, o corpo padece em suas necessidades junto com o pobre e debilitado coração que, para minha surpresa, ainda bate em meu peito agora despido.E a veste do meu cárcere carnal, tão sóbria, ébria e límpida, recobrindo e encobrindo meu coração já fragmentado, espaçado na lona, nocauteado... Ah, atrofio meus pensamentos solenes e tempestuosos e me desfaço na torrente de lágrimas que inunda cada suspiro que elevo a ti.Recolho-me em pranto...Acolho-me em fé, e velo cada noite buscando minha casca de melancolia...tão tristonha, despedaçada em pétalas ásperas, como o arrepio que incita cada pelo do meu corpo...     

    Emerge então, no silêncio sepulcral de meu recanto, a minha essência humana, meus desejos. De repente, me pego em devaneio profundo e extasiante no escuro do quarto, imaginando tuas formas, relembrando teus gestos tantas vezes contidos, temerosos. Ai que essa distância expressa em números, palavras e sentimentos, me abrasa a pele, me eleva ao fim de meu mundo, e mesmo assim,me pego cego em vontades e histórias: meu "Insight" sagrado de cada dia. Deito-me em meio ao sublime e ao profano e caio nas reentrâncias do meu ser. Ah saliência maldita que me impulsiona a lançar-te a mão, e em vão, sedento de movimentos improfícuos, ajo como um desvairado e corto a escuridão a tua procura e sem perceber, desintegro-me da realidade e ainda em sonho, tateio as fúnebres paredes na ilusão de encontrar teu corpo. 

    Eis que a dor me desperta... Dobro meus joelhos ao chão e imploro continuidade: Sabe-se lá a angústia que me toma...E como a cicuta, tomo-a também, fecho as portas, as cortinas...Findo o espetáculo, e jogado em fluído lacrimal, declaro fim de ato.  Enfim, jaz o poeta. Resta somente uma grande porção de humanidade, de sopro de vida racional, gélida e sem muitos atrativos.  Mas de repente, uma foto, uma memoria que ressurge em mim, e é novamente o sofrimento, a inquietação: a vida agora parece estar novamente em um ciclo, e desta vez, de tristeza.

    As palavras agora me faltam, e então, escuto o irromper das batidas frenéticas de meu coração de encontro ao infinito que o silêncio projeta em cada um. infinita também é esta minha dor; o meu amor não,este é agráfico,intangível por minhas meras vontades e sonhos compartilhados.Talvez seja por não alcança-lo que permaneço assim, a viver apenas seus relances.    Sopra-me ao ouvido o som, augural e hipocondríaco dos gritos que deixei pra trás, Ah... Rogo para sucumbam no ar...E lanço minhas forças num antegozo de nostalgia...E lanço-me entre as farpas aveludadas dos teus dedos.

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